Na minha perspectiva, viver é aceitar que, diariamente, seremos modelados. Algumas experiências virão suaves, como lixas que polem arestas. Outras, duras como marretas, capazes de nos partir ao meio. Mas é nesse embate que, conscientes ou inconscientes, nos construímos. Não se trata de resignação, mas de compreender que ao esculpirmo-nos, teremos uma chance maior de revelar habilidade e talentos antes escondidos. Nunca é uma garantia, mas aumentamos consideravelmente as probabilidades.
Há quem lamente as dificuldades, desejando uma existência sem fissuras. No entanto, o mármore liso ainda que bonito, não se compara a uma escultura entalhada. Parece-me que cada cicatriz emocional, cada erro cometido, cada recomeço inevitável, é parte do desenho que a rotina está talhando em nós. Somos obra em andamento — imperfeitos, sim, mas em constante aperfeiçoamento.
O curioso é que, ao contrário do artista que vê a pedra de fora, nos esculpimos a partir de dentro. Somos, ao mesmo tempo, matéria-prima e escultor. As escolhas que fazemos — ou deixamos de fazer — moldam nosso contorno, definem nosso olhar, nossa firmeza, nossa elegância no trato com o cotidiano.
Ao compreendermos o valor do cinzel das experiências, superaremos com mais facilidade as agruras da existência. Auxilia a não nos desesperamos quando a vida bate forte: respiramos fundo, observamos, aprendemos, aprimoramo-nos e avançamos. É tão falada “vida que segue”.
Suspeito que como o bloco de pedra, a vida boa, fina, elegante e sincera está ali, pronta para ser esculpida.


