O JOGO DE DEUS – Uma leitura pessoal da criação do mundo
A eternidade cobrava seu preço. Deus estava enfadado.
Ele que era a causa primária de todas as coisas, perdia a paciência com qualquer sol mais brilhante ou buracos negros impertinentes. As mais belas constelações já não lhe encantavam e a harmonia das estrelas agora não embalava os miliênios e milhões de eras a passar.
– Quero algo que seja um espelho do que tenho, sou e faço – idealizou o Onipotente.
– Um… Um.. Um Deus talvez? – questionou-se o Criador revirando os olhos para o seu céu sempre azul-monótono.
– Deus me livre! – exclamou. Não suportarei outro chato e ranzinza.
– Preciso de alguma coisa para preencher o meu tempo. Algo que me encante e decepcione, inspire-me e me dê ganas de matar. Que seja a encarnação de todas as qualidades e contenha a totalidades dos defeitos. Que me faça chorar de dor e alegrias, celebrar as conquistas e me solidarizar nas derrotas.
Que não seja eterno, para valorizar o existir. E que embora, seja minha criação, esqueça-se disso, e acredite que não tenha poder, pois senão, em um par de milhões de anos, terei concorrência divina, e tenho certeza que não gostarei disso.
Claro que deve temer-me, mas jamais deverá ter certeza da minha existência. Por isso, encherei seu coração de medo e crenças. Estará tão ocupado em tentar entender a confusão que instalei dentro dele, que morrerá sem saber quem é.
O Altíssimo então apenas desejou e diante de seus olhos que tudo veem, embora com um pouco de miopia, materializou-se o Homem.
Deus olhou a sua criação e pensou:
– Bonitinho. Mas se desejar controlar esta peste, necessitarei de alguma coisa que seja bonita o suficiente para atraí-lo e insatisfeita o bastante para mantê-lo ocupado tentando fazê-la feliz.
– É impossível, mas ele jamais saberá disso – pensou o Criador, com um meio-sorriso celestial. Então estava feita a Mulher.
E para compensá-lo, Ele deu ao Homem a incapacidade crônica de prestar atenção em qualquer coisa que não fosse o próprio umbigo.
Então o Uníssimo pensou:- Eu não posso ser tão duro. Eles merecem um prêmio pela diversão que me proporcionarão – e o Abençoado deu-lhes a sexualidade. E eles imediatamente começaram a transar. Não paravam mais. E o Onipotente teve um surto de inacreditável e santa inveja da felicidade do casal.
Soprou seu hálito sagrado sobre eles, inoculou-os com a culpa e dela surgiu a primeira criação humana: o Diabo.
– Perfeito! – exclamou o Benfazejo. Em seguida, criou a Terra, a natureza, os bichos e tudo que existe para o usufruto de seus filhos pródigos.
Satisfeito com a sua nova invenção, retirou-se aos céu para descansar e como tudo lá é eterno, Ele continua a dormir e esqueceu-se de nós.
Filósofo nas horas vaga, tem uma curiosidade inata pelo comportamento humano, realizando paralelos muito instigantes entre o ser humano e a evolução das espécies, tema sempre muito presente em todas as suas palestras e cursos, e muito apreciada pelo seu público.