Somos primatas frustrados com a nossa natureza.

Somos primatas frustrados com a nossa natureza. Quem dera pudéssemos voltar às savanas. Como não podemos, o truque é avançar ao parahumano. Mas antes, precisamos conhecer, aceitar, compreender e orgulharmo-nos do que sempre fomos: primatas fascinantemente contraditórios.

Somos um primata desconfortável dentro da própria pele. Um bicho de terno que sente falta da terra nos pés. Passamos milênios aperfeiçoando ferramentas, mas ainda tropeçamos nas emoções. Quem nos visse nas savanas, suando sob o sol, talvez não imaginasse que um dia iríamos suar mais dentro de um escritório fechado.

Gostaríamos de voltar. À simplicidade, ao tempo em que a vida era um agora puro — caçar, comer, dormir. Mas essa volta é impossível. Há wi-fi demais entre nós e o mato. A única direção viável parece ser para frente, onde nos espera esse conceito meio nebuloso, meio sedutor: o parahumano. Um salto evolutivo. Ou, quem sabe, só um novo disfarce para as mesmas confusões antigas.

Enquanto não cruzamos essa linha imaginária da superconsciência, ficamos aqui, tentando equilibrar o celular numa mão e os dilemas existenciais na outra. Já conseguimos ir à Lua, mas ainda não sabemos lidar com uma mensagem visualizada e não respondida. Somos um paradoxo com CPF.

Antes de nos transformarmos em alguma coisa “além do humano”, seria elegante olhar no espelho da espécie e reconhecer o que vemos. Não com vergonha, nem com soberba. Apenas com o encantamento de quem descobre que, por trás da testa avantajada, ainda lateja o instinto.

Somos sim um amontoado de contradições ambulantes. Temos capacidade de empatia e impulso de manada. Amamos com intensidade e cancelamos com a mesma força. Construímos catedrais e destruímos florestas — às vezes, no mesmo final de semana.

No fundo, talvez seja isso que nos torna tão fascinantes. Somos primatas que escrevem poesias, choram com filmes e gritam no trânsito. Uma espécie que tenta desesperadamente encontrar sentido, mesmo sabendo que o universo, lá fora, continua em silêncio. E nós aqui, tagarelando.

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Conheça o Jojo

Filósofo nas horas vaga, tem uma curiosidade inata pelo comportamento humano, realizando paralelos muito instigantes entre o ser humano e a evolução das espécies, tema sempre muito presente em todas as suas palestras e cursos, e muito apreciada pelo seu público.

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