E vice-versa.
Quando criança, trabalhava como doméstica, numa casa de um amiguinho próxima a minha, uma afrodescendente, de nome Maria, com um comportamento muito curioso: estava sempre rindo e cantarolando.
Lembro-me de, muitas vezes, ao visitar o meu amigo, lá estava ela a cozinhar e cantar. Havia um periquito na cozinha, que tinha o hábito de acompanhá-la, numa verdadeira sinfonia doméstica.
Em algumas tardes, ela nos fazia um lanche e conversávamos, quando então ela contava sobre a sua vida, cravejada de desafios: mãe solteira de três filhos, recebendo um baixo salário e morava em uma comunidade distante que a obrigava a pegar os precários ônibus da década dos sessenta.
No entanto, tudo isto era descrito, entremeado do quanto ela achava a casa dela era aconchegante, seus filhos eram lindos e como ela gostava do que fazia. Tudo isso, entre fatias de bolo ou pão quentinho. Aquilo me impressionava muito
Muitos anos depois, já adulto, ao reencontrar o meu amigo de infância, perguntei pela Maria e ele me respondeu:
– Está vivinha da silva, sempre sorridente e fará agora 101 anos!
Na contramão da história de vida da nossa amiga, tenho um ex-colega de faculdade que nasceu com um grande tino comercial e com este talento, construiu um patrimônio respeitável, conseguindo adquirir ao longo da sua vida, mais de 50 imóveis, que aluga, amealhando uma renda mensal considerável, que lhe oportuniza viver realmente cercado de muito conforto. Uma vida muito boa.
Temos uma relação fraternal e quando nos encontramos, damos muitas risadas, recordando das nossas aventuras do tempo do curso de educação física, em Florianópolis.
No entanto, as risadas são entremeadas de muita frustração: os locatários que não pagam, os filhos que só pedem dinheiro, a terceira esposa que gasta muito, as decisões econômicas que só o prejudicam, os seus problemas crônicos de saúde. Nunca ouvi da sua boa, a descrição de uma experiência feliz.
Estes exemplos não significam que todas as pessoas nas situações da Maria e do meu amigo, sempre se comportarão conforme descrevi acima. Cada vida é uma saga muito particular. Mas, definitivamente, na minha perspectiva, a percepção de plenitude, felicidade, não passa obrigatoriamente, pela conquista de uma vida boa.
Ao fim e ao cabo, a sensação de sentirmo-nos pessoas de sorte, inclui muito de como vemos o copo com água pela metade: ou reclamamos, porque o copo está quase vazio ou felizes porque ainda temos água para beber
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